Também, qualquer um tem que botar pra fora alguma hora, senão baubau na colher de pau: Alzheimer, baby, a doença do now forever, do nevermind future, da memória pura, a minha morte, aquela coisa abstrata que surge sem dor devido ao excesso de informação. Cachoeira melequenta azul que lança mil imagens. Porque tudo o que é computador, tv, holograma, onda eletromagnética, tudo o que não é, mas parece vivo, é azul. Alzheimer é uma palavra azul que me faz lembrar de Lisboa apesar de nunca ter estado lá.
Uma carta de 1854 de Portugal a Budapeste, uma húngara chamada Gábor, uma família virtual, um suicídio na rua das laranjeiras. Que nome bonito: das laranjeiras. Imagino prédios distorcidos por uma grande angular em contra-plongée. O caderno da mãe que olha pra filha e o caderno da filha que olha pro mundo cheio de máquinalmas vivas e humanóides teleguiados, uma dúnamis assim futurista de onde se taca uma mãe em busca de sua mãe. No ar, um suicídio calmo e bem articulado, uma velhinha de oitenta anos que flutua, rainha do século passado em queda. Um caderno de 1917 e outro dos anos 80. A alma exterior e a alma interior, sendo que a primeira não é o espelho da segunda. Precisamos de um referencial externo. O meu agora parece ser múltiplo ao mesmo que condensado numa mulher imaginária, paradigmática.
A linha sintagmática se quebrou, a cultura e a história, a história e a história da cultura, tudo linear, tudo rumo a um fim pré-determinado, o povo no passado, a elite no presente apontando pro futuro, tudo uma mentira assim muito bem contada. De vez em quando iluminista, querendo racionalizar este povo estúpido, e de vez em quando romântico, querendo me lembrar de um lugar onde não estive (que já não quero mais estar). Parece uma boa onda.
O povo polvo. La plebe pueblo (não consigo dizer isso). Os tentáculos do povo que alcança tempos passados, as patas de riqueza que só servem pra se coçar. E o pior é que me encaixo nessa de crer numa preservação de um passado humilde, e isso talvez por achar que o Piauí não taí, tá é noutra idade, noutridademédia. A mídia, a média, a moda. Mas é outra média.
Plongée nos pés, no baixo-ventre, nessa onda grotesca. Grotesco é o que vem de gruta. Gruta matuta truta, cheio das treta Tuta. Contra-plongée nos já citados arranha-céus, world trade center, favelão e várias coisas mais. De vez em quando entre a Gama Filho e São Sebastião cravado de flecha passa um avião assim, curtindo o azul do céu, azul que é cor virtual you know? Daí " - contra-plongée + plongée = massa ". Olhando pra frente vejo mil rostos desfocados, desbocados, desnucados, destocados, deslocados. Daí nem grutas nem cúpulas, mas rostos cheios de pó e cinza, como ctônicos titãs que procriam entre o grotesco e o canônico, entre o cômico e o melodramático, entre a flauta mágica e a lira pedagógica, entre o caos e a harmonia, entre Apolo e Dioniso, entre movimento e imagem, entre margem e centro, entreatos.
As pessoas são como entreatos, caminham na primeiro de março sem saber pra onde. Mergulhão, aviões, perimetral, calçadão, barcas... plongée, contra-plongée e plano médio. Temos Deus nosso senhor, que em sua santa paz olha pro homem subordinado, temos o homem que procura Deus nos céus azuis, mas que só encontra helicópteros e aviões, e temos, por fim e nos conforme, a máquina que espia a massa tresloucada. Porque, se pensarmos bem, quando a humanidade for pro beleléu, só vai sobrar um desses três planos.
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